quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Belo e Beleza : Platão vs. Plotino


Wang Du, Galerie Laurent Godin, Paris, 2005.

Para Platão (c. 427 a.c – c. 347 a.c) o que não for Verdadeiro, não é Belo e, por isso, não representa a arte. Considera mesmo que a arte é uma espécie de loucura divina, comparando-a à religião e ao amor (Rosana Madjarof). O amor é, aliás, o “responsável” pelos feitos mais belos, e amar o mesmo que o supremo Bem. A beleza está no domínio do sensível. No entanto a estética de Platão é evolutiva e é, por isso, natural que nos últimos textos apresente pontos de vista divergentes com outros anteriores. O resultado dessa “evolução” hierarquiza a beleza em três tipos: no Hípias Maior, a beleza do corpo pertence à beleza inferior (junto a qualidades inferiores como a saúde, força e riqueza); no Fedro (sobretudo), a beleza das almas, manifestando-se a beleza verdadeira; e a beleza em si, para os sábios.
No Banquete Platão estabelece, definitivamente, estes três níveis, expondo o caminho do Amor em direcção à Beleza. Para ele o amor é o desejo do próprio amor, é o desejo pelo que se não tem, para um Amor Absoluto e incondicional. Embora amar o Amor não seja belo, através do amor podemos perceber a beleza Ideal, absoluta, eterna e infinita (divina).

Filosofia “anti-arte”
Na filosofia platónica o percurso para a verdade é prejudicado pelo erro “cometido” pelo mimetismo ou imitação que a arte faz (Panofsky): 
é do “Belo-em-si” que precisamos de nos aproximar o mais possível, embora admita ser intangível, não estando ao nível da vida, do mundo terrestre. 
Através da imitação não se pode alcançar o mundo das Ideias – o mundo que importa, verdadeiramente, conhecer. Para Platão, a realidade não é mais do que uma cópia imperfeita (Bayer); o falso, ilusório, a retórica ou o trompe l’oeil não são dignos de serem qualificados como objectos de arte. Desta forma a pintura, embora seja considerada obra de arte, é “perigosa” porque prejudica o “caminho na direcção da verdade”, é uma “ilusão fictícia” da realidade, “enganando-nos com as suas formas e cores” (Huisman). Platão faz a distinção das artes que considera verdadeiras: arquitectura, escultura, teatro, pela harmonia, simplicidade e pureza que podem transmitir. 

A influência de Platão
Segundo Huisman, o platonismo exerceu uma influência tremenda sobre os seus sucessores “pensadores” e filósofos. Aliás, a sua influência no epicurismo é incontestável, embora exista uma diferença considerável entre o sentido das Ideias e o jogo da imaginação nos Epicuristas, para quem o bem é o prazer e o mal a dor (Bayer). Nos séculos seguintes notar-se-á, também, essa influência, quer na Idade Média, no Renascimento ou até no século XVII (Huisman).

«A beleza reside essencialmente nas almas.» - Platão
Plotino (205 – 270) é considerado o fundador da escola neoplatónica. A expressão neoplatonismo serve para diferenciar a sua filosofia da de Platão (Jayme Paviani). A sua estética é inspirada na de Platão, embora ao espírito dialético deste se oponha o seu espirito místico (a primeira forma da filosofia mística). O seu “compromisso com a beleza” renova, de certa forma, o conceito de Arte”.
Encontra-se em Plotino uma teoria da medida e da proporção, a que junta uma teoria da pureza e do branco, assim como uma teoria do brilho e da beleza imaterial (de Platão), mas o plotinismo ultrapassa-a para o ilimitado, “sem medida”. Essa visão é clara nos seus três grandes tratados estéticos (Bayer):

Do belo – no qual, como ponto de partida, toma o ponto de vista de Platão: a beleza da vista e do ouvido; depois a beleza intelectual das ocupações, das acções, das ciências e das virtudes. «O belo encontra-se sobretudo na vista; está também no ouvido, na combinação das palavras na música de toda a espécie; porque as melodias e os ritmos são belos; lá também, subindo das sensações para um domínio superior; ocupações, acções, maneiras de ser belas; há a beleza das ciências e das virtudes.», numa clara referência mística.

Da beleza inteligível: o belo é o laço das Ideias. A profunda ligação entre o eu e o real. O processo de purificação para alcançar esta visão é o que se pode chamar o misticismo de Plotino: uma contemplação às cegas, uma visão virada para dentro e sem ligação com o exterior. A expressão “máxima”, com “inspiração superior”, não através da cópia (a que se opõe) mas através do encontro de si próprio como artista (“criador”), uno com a natureza. “O bem é o belo agido. O belo é o bem contemplado.”

Do bem: Enquanto a realidade para Platão não era mais do que uma cópia imperfeita, Plotino reduziu o universo à visão porque toda a natureza não é mais do que uma visão imperfeita. Esse iluminismo contradiz a dialética de Platão e revela, pela primeira vez, a beleza do bem, suprema, divina, numa concepção mística do universo. E sobre a beleza do informe diz: “(...) Não podemos apreender nem a figura, nem a forma (...O O amor que por ele temos é sem medida (...) é uma beleza acima da beleza”.
«As artes não se limitam à imitação pura e simples daquilo que passa diante do nosso olhar.» - Plotino
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABBAGNANO, Nicola – História da Filosofia vol. I (Editorial Presença, 1985);
BAYER, Raymond – História da Estética (Editorial Estampa Lisboa, 1979);
GONÇALVES, Carla Alexandra - Estética e Teoria Da Arte – Sobre O Mundo e o Entendimento das Obras de Arte - e-book (Universidade Aberta, 2008);
HUISMAN, Denis – A Estética (Edições 70, 1984);
READ, Herbert – A Educação pela Arte (Edições 70, 1982); 
MADJAROF, Rosana – in http://www.mundodosfilosofos.com.br/platao2.htm;
PAVIANI, Jayme – Filosofia e Método em Platão (edipucrs, 2001);
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - O Neoplatonismo: Plotino - http://www.pucsp.br/~filopuc/verbete/plotino.htm;


1 comentário:

  1. Mais uma vez, magnífico. Parabéns, e não pude deixar de recordar alguns grandes momentos de um curso que adorei.

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