quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Luar (doce) de Natal (Conto, 2009)



Enquanto percorria as ruas da cidade, principais artérias de uma baixa em alta tensão, devorava, lambia a cidade com os olhos, esbugalhados de fome e “comia” com gosto, com esses mesmos olhos, as luzes de Natal, como se fossem chocolatinhos embrulhados em papel delicado de alumínio.

- Que delícia! - pensava.

Ninguém lhe perguntava porque ia ele a sorrir, num autocarro apinhado, atafulhado de pessoas, de sacos, tantos com presentes. Ele continuava a pensar:
- É tão bom o frio que está lá fora. Aqui dentro está quentinho... hum! - estava feliz.
Em casa, enquanto a mãe embrulhava os presentes com jeitinho e movimentos quase coreografados mas delicados, ele embrulhava, sem papel, com beijinhos cheios de carinho, os pensamentos, bem arrumadinhos, para os entregar na noite especial.

Na noite de Natal, depois de ter desembrulhado os beijinhos todos e distribuído pelas pessoas que se juntaram à volta da grande árvore, a mãe chegou-se ao pé de si e disse-lhe ao ouvido:
- Não faz mal, não faz mal!
Apressadas, quase stressadas por nunca mais chegar a sua vez, as crianças esqueceram (ou nunca chegaram a saber?) todo o amor que ali se vivia. Nas mãos pequeninas, de crianças ainda mais pequenas, imensos brinquedos e nenhum, nem um só beijinho saiu de lá.
- Vá lá, não faz mal. P’ró ano há outro Natal!
O menino não chorou, porque a mãe lá ficou e ao seu lado o amou. Quando à noite se deitou, lembrou, lembrou, lembrou, que afinal o tal beijo que quis dar a toda a gente, voltava sob a forma de um queijo que a lua devorou. Essa, estava lá fora, alta, por entre as árvores escondida a devorar, tão contente, os tantos carinhos que ele tinha oferecido como presente.


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