segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Memórias #4 - Garrett: um nome de múltiplos significados


Garrett é um Almeida, escritor e dramaturgo, que criou uma das mais dramáticas cenas do teatro português (em Frei Luis de Sousa, 1843). Entre Almada e Lisboa, a ação conta com um Tejo pelo meio, meio mar que separa as duas margens e as tramas que na peça acontecem.

Garrett é uma embarcação que atravessa o Tejo... O mesmo rio que testemunha muitas outras histórias, igualmente dramáticas ou felizes. Eu sou feliz por sobre as suas águas poder inspirar-me e evadir-me em pensamentos. A maior parte deles esvaem-se assim que o barco atraca num dos cais. Alguns atraco-os a palavras com que vou escrevendo muitos dos meus textos. Como este, que por hoje ficou atracado no Cais do Sodré. E subo para o Camões.

Garrett é uma rua que atravessa a baixa lisboeta, que no dia 25 de agosto de 1988 testemunhou um incêndio que fez do Chiado um espetáculo de fogo e fumo, e que nesse dia todos os lisboetas quiseram e puderam testemunhar. Há precisamente 26 anos, da janela do quarto andar onde morávamos, perto da Calçada do Combro, também consegui assistir aos fumos que cobriam a cidade. Podia senti-lo como um prenúncio daquilo que era uma passagem dos tempos do Grandela para o atual tempo do centro comercial que acabou com a tradição das compras naquele mítico espaço comercial. Após demorados anos de reconstrução, os lisboetas puderam criar nova tradição de consumo naquela emblemática e movimentada zona. Nessa rua já não se compra leite.

Garrett foi uma leitaria do Chiado, que por sua vez inspirou o Vitorino. Muitas vezes em criança, quando ia para a escola, passava por ele que na esplanada da Taberna do Leão (frente à RDP, ao fundo da rua de São Marçal, em Lisboa) aguardava que a inspiração chegasse. Ou que a vida simplesmente passasse. De mim não passou a sua música que ainda guardo, com gosto, na memória:
No Chiado à tardinha, às vezes, Sorridentes vão de mão na mão, Bons rapazes, são bons portugueses Ai Madame a sua indigestão 
Ideal das empregaditas A finória vai um figurino Tão caraça, veste muitas chitas Diz olé! prò Montefiorino 
Leitaria Garrett dá cá o pé Ai tira a mão, João, Da coxa doce, Já está, antes não fosse... O Saricoté, foi parar à Marques Lá pràs Belas-Artes... 
Assim mesmo é que é! (Diz o progresso) Chá com torradas, João, Pra onde é que eu vou, Já fui, mas já não sou Linda mocidade, foi-se o Sol embora, Fica-me à Saudade... 
Leitaria Garrett (1984), de Vitorino
 Vitorino no Coliseu 1985 - Leitaria Garrett


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