É impressionante a quantidade de programas de televisão cujo conteúdo se baseia ou é maioritariamente constituído por imagens de criminalidade, que na maior parte das vezes inclui violência. A violência nos canais de televisão é banal(izada) e muitas vezes gratuita, começando nos quatro canais generalistas (RTP1, RTP2, SIC e TVI), e estendendo-se pelos canais por cabo. Uma breve passagem de olhos pela grelha de programação desses canais não deixa dúvidas para esta banalização a que a sociedade portuguesa tem facilmente acesso diariamente. Basta ligar a TV.
Observei uma semana desta programação e verifica-se. As observações que aqui deixo não são exaustivas nem analíticas, mas deixam muitas pistas sobre a banalização que refiro e deixo a pergunta: haverá relação entre a violência existente na televisão que temos com a realidade violenta que existe no mundo?
Apesar de tudo, nos canais generalistas da televisão portuguesa a maior parte da grelha não é ocupada com uma programação que particularmente inclua violência. Os casos pontuais verificam-se nas telenovelas e, sobretudo, nas notícias que dão conta de crimes - muitas vezes violentos, o que justifica ainda mais a sua inclusão no jornal, como notícia - ou no comentário demasiado breve de alguns crimes, feito nos programas diários durante a semana que ocupam a maior parte da manhã ou da tarde. Habitualmente esta análise é feita por especialistas minutos antes das notícias das 13:00.
A violência também entra pelos ecrãs destes canais através dos filmes. Dos quatro, a RTP2 é aquele onde menos se encontram imagens deste teor (excetuando os noticiários diários mas de reduzida expressão em relação à restante programação deste canal).
Não distingui os períodos de fim de semana com o resto dessa semana, mas o horário.
Por volta da meia noite, na RTP, Safe (2012), um filme estadunidense de género ação, aventura e crime. O poster mostra precisamente o protagonista a apontar uma arma ao... espetador!
Gomorra (2008), filme italiano sobre a máfia napolitana, a Camorra. "Dois rapazes roubam cocaína de um grupo de colombianos e são advertidos por Giovanni um dos chefes. Porém roubam armas de um esconderijo e depois assaltam um bar." Droga, crime, logo, violência. No poster os jovens protagonistas também empunham armas.
Arrow (2012), é uma série estadunidense baseada no personagem de BD Lanterna Verde, Oliver Queen, um playboy que se perde numa ilha deserta e que após cinco anos retorna para combater o crime e a corrupção de sua cidade.
Liberdade 21 (2008), é uma série portuguesa de género judicial. Ora, havendo necessidade de justiça e advogados, pressupõe a existência de combate ao crime.
Na SIC esse fim de semana começa na sexta-feira à noite, depois da ultima novela ( da meia noite) com Investigação Criminal - Los Angeles (2009-), uma série estadunidense sobre o Departamento de Projetos Especiais (OSP - Office of Special Projects), "uma divisão da NCIS que tem a missão de prender criminosos que significam uma ameaça à segurança da nação" (americana). A noite continua com a série também americana Mentes Criminosas (2005-), que já vai na 9a temporada, "sobre a UAC (Unidade de análise comportamental), uma esquadra de elite do FBI, com sede em Quantico, Virgínia. A equipe analisa criminosos do país por meio do Modus Operandi e a Vitimologia dos mesmos e antecipa seus próximos movimentos antes de eles golpearem outra vez. Neste quesito, a série difere-se de outros dramas policias por focar mais no comportamento criminal do suspeito do que o crime em si."
A noite de sábado começa com O Contra-Ataque (2010), uma série inglesa sobre uma unidade secreta de inteligência militar britânica que combate o crime, sobretudo terrorista. O poster tem duas silhuetas de militares empunhando armas, com um fundo em tom vermelho (sangue) e um grafismo radial em contraste formado por balas. A composição fica composta com a frase que lhe serve de slogan: "O mundo não se salva a si mesmo." (No original "The world's not saving itself.") É por isso que são precisas armas (muitas armas) e violência (muita violência) para combater as armas e a violência no mundo. Faz sentido, não faz?
A SIC tem atualmente em exibição uma mini telenovela brasileira, O Rebu (2014) cujo enredo gira à volta de uma misteriosa morte.
É verdade que nem todos os crimes pressupõem violência. Mas estão quase sempre associados a maldade ou má conduta, que convém erradicar da sociedade. Mas como é que a sociedade se pode ver livre de atos cruéis, se o Homem tem em si maldade? Não pretendo dar uma aula de moral, mas acredito que ao refletir sobre a imoralidade que existe no mundo - e que o média televisivo expõe com vulgaridade - faz de mim uma pessoa com maior consciência e, logo, querer ser uma pessoa melhor, sem pensamentos ou atos maus. Consequentemente, mais feliz. Como dizia Epícteto:
"Se queres ser bom, convence-te primeiro que és mau."
O média também não é o problema, já que às pessoas cabe o julgamento e a filtragem necessárias para a sua vida. Afinal, eu também cresci a ler histórias da Agatha Christie ou a ver, sempre muito atento, a série protagonizada por um dos mais famosos personagens das suas histórias, o detetive Poirot. Talvez seja ela, ainda, a principal responsável e inspiradora de todos as séries e filmes friccionados (não reality shows) que vieram depois dela.
O problema é que nem toda a gente tem a capacidade de julgar corretamente as imagens (sobretudo imagens) que vê por forma a que elas se não venham a refletir nos seus próprios atos. A preocupação deve recair, principalmente, sobre os conteúdos a que as crianças e jovens assistem. É que apesar das classificações etárias a que estão obrigados os canais sobre os programas que exibem, a verdade é que isso não impede a que se tenha acesso a eles e em qualquer hora do dia. Uma preocupação que os educadores (pais ou qualquer outros) devem ter. Sem lições, sem moralidades bacocas (do género faz o que digo e não o que eu faço). Para bem da nação. E da televisão.
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