domingo, 23 de novembro de 2014

Um hospital secular à beira mar plantado



O tímpano da entrada nartex do HOSA (Hospital Ortopédico de Sant'Ana) contém uma cena com uma figura feminina de braços abertos, com seu manto estendido na horizontal, a tentar abraçar e acolher aqueles que desta casa precisam para se sararem das enfermidades do corpo. A génese da palavra hospital remete para o verbo que se pode criar com o seu substantivo: hospitalar, para dar hospitalidade aos enfermos.

Rosendo Carvalheira, juntamente com cinco arquitetos, desenha, no espaço de um ano, o edifício cuja primeira pedra foi lançada em 1901. Nos bastidores Claudina Chamiço (Schmit) é a mulher que impulsiona a obra, na qual faz questão que o seu nome não figure sequer na gravação dessa primeira pedra, mas é ela que faz com que seja possível concluir o sanatório em 1904. Um ano depois, é construída a capela que ainda hoje se encontra no local. 

O sanatório nasce para combater e sarar as muitas pessoas que uma terrível doença dizimava no início do século XX e cuja cura se desconhecia: a tuberculose. Os cientistas da época apostavam na prevenção. Embora apenas 10% da população a infeção evoluísse para tuberculose, destas quase todas acabavam por morrer por sua causa .

Claudina estabelece logo muito claramente a organização para os objetivos traçados, sem olhar a meios para atingir os fins, com todas as regras necessárias, incluindo os cuidados a administrar aos pacientes. Com 89 anos faz um ultimato ao governo, ameaçando com o fecho do hospital, totalmente suportado por si, num período de revolução (c. 1910) em que sofreu uma lapidação, quando se via sem condições para tratar dos 100 doentes - capacidade máxima. Ela, que não era de ficar de braços cruzados. Ela, que se fez valer das fortunas que herdara (incluindo a sua própria), a favor da humanidade, ficara sem as pessoas  - as irmãs - que cuidavam dos enfermos.

A sua persistência, humanidade e fé fizeram com que conseguisse que o sanatório se mantivesse.

Em 1961 a designação do espaço passa de sanatório a hospital. Deixou de fazer sentido como sanatório, com o advento e evolução da medicina, com os antibióticos, a anestesia e os analgésicos. D. Claudina deixou o hospital à SCML, juntamente com os meios para o seu funcionamento, por causa dos princípios dessa instituição, com mais de 500 anos. Apenas durante cinco anos (entre finais da década de setenta e início da de oitenta) terá sido propriedade de privados, mantendo-se quase sempre na gestão e administração pública, como D. Claudina tinha preferido. 

Em breve será lançada a primeira pedra para a construção de um novo hospital ortopédico de Santana, provavelmente com outra designação e nunca substituindo completamente o anterior, a celebrar os 110 anos. Sempre com a gestão da SCML.

Vale a pena a sua visita guiada, cujos comentários experientes são tripartidos entre três guias tão diferentes.

«Classificado pelo IGESPAR, como Monumento de Interesse Público, nesta visita fique a conhecer uma obra muito inovadora que conciliou a funcionalidade à beleza, bem como aspetos mais importantes da história do Hospital sobre religião, arte, arquitectura, ciência e saúde.
Esta iniciativa é articulada entre o HOSA e a Direcção de Cultura da SCML, realizam-se sempre nas terceiras 5ªs feiras do mês, por volta das 14:30 e necessitam de inscrição prévia, através dos telfs. 213 235 824/ 233/ 421/ 065.»

(mais informação aqui)


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