terça-feira, 27 de maio de 2014

O mito do rapaz rosa


Conto Infantil Mitológico
O rapaz Rosa, não nasceu flor. É Rosa de nome. Hipólitus Rosa, assim é que é. Como o seu primeiro nome era complicado, e não tinha segundo, por Rosa era tratado. Ele não gostava nada, mas não tinha opção. Assim, por causa dos outros meninos, que gozavam com ele, ou melhor, com o seu nome, foi-se afastando deles e das brincadeiras de grupo. Isolou-se em si mesmo e nos seus próprios jogos. À medida que ia crescendo, mais se afastava e não deixava ninguém aproximar-se que era logo “picado” pela sua amargura.

Um dia, Tlaloc, o Deus asteca da Chuva e da Água (e que também era o Senhor do raio, do trovão e do relâmpago), mandou chamar o seu escravo Regador. Tlaloc também tinha um nome “esquisito”, e, como o rapaz Rosa, não gostava nada que gozassem com ele. E ninguém se atrevia a fazê-lo, pois ele, para além de Deus, era rei e Senhor! Tlaloc compadeceu-se do rapaz Rosa e, do alto do seu trono, vestindo o seu deslumbrante manto azul turquesa, ordenou o Regador, que era responsável pela distribuição da água pelos céus, pela terra e pelo Universo, que fosse espalhar a sua água por cima do rapaz Rosa.

Ele assim fez.
O rapaz Rosa, quando sentiu as pingas de água cairem sobre si, pensando que eram “apenas” gotas de chuva (de facto, isso parecia), deixou-se estar e molhar, pois a água era a única coisa que ele gostava, realmente, de tocar e que o tocasse. Alguns segundos apenas bastaram para ficar encharcado e a chuva parou de repente. Antes que tivesse, sequer, tempo de correr para casa e se secar, algo extraordinário aconteceu: da sua pele, por todos os lados, começaram a sair uns pequenos picos. Ao princípio pareciam borbulhas, ou até varicela. Mas ele não tinha comichão. E iam crescendo.

Da cabeça começou a brotar uma película que parecia descascar-se suavemente, e aos poucos, começou a assemelhar-se ao botão de uma flor. O seu corpo estava cada vez com mais picos, que iam crescendo até o cobrirem quase por completo. Em pouco tempo, o botão de flor, na sua cabeça, desabrochou e revelou ser uma rosa. O rapaz ficou completamente transformado nessa flor, dos pés à cabeça. Coberto com espinhos mas com uma lindíssima cabeça que atraia os insectos mais coloridos.

Estava concluído o processo de metamorfose do rapaz Rosa. Agora ninguém podia chegar perto dele, pois corria o risco de se picar. Apenas os seu novos e minúsculos amigos insectos. Ele não estava triste. Afinal, toda a sua vida tinha vivido a afastar-se de todos. Mas agora estava completamente isolado, restando-lhe caminhar, jardins fora, à procura de outros iguais a si, que não o “picariam” e a quem ele também não podia magoar.

Inspirado em:
«Quod petis, est musquam [...] ista repercussae, quam cernis, imaginis umbra est: nil habet ista sui.» Ovídio
Livro III d’As Metamorfoses, v.433 e ss. – Narciso e Eco (OVÍDIO, 2006); Na tradução de Domingos Lucas: “O que desejas não existe! [...] Essa sombra que vês é o reflexo da tua imagem! Nada tem de seu!”.

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