quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Cyrano de Bergerac (Teatro) - Cheira-me que há muito talento


A peça de teatro Cyrano de Bergerac estreou no passado dia 8 no Teatro Nacional D. Maria II, coincidindo com uma data de aniversário que foi pretexto para a compra e oferta dos bilhetes. Exatamente vinte dias depois da estreia, assisti a esta produção do TNDM II, com versão cénica e encenação do 'mestre' João Mota.

Cyrano nasceu em 1619, não em Bergerac (uma pequena cidade do interior sudeste de França onde existem duas estátuas do personagem real) mas em Paris. Herdou o nome, Hercule-Savinien Cyrano de Bergerac. Lê-se na apresentação da peça que era
«Um apaixonado poeta. Um perspicaz dramaturgo. Um exímio espadachim. Um bravo soldado. Um grande filósofo. Um profundo estudioso da Física, Matemática e Astronomia. Cyrano de Bergerac possui qualidades incomuns, porém encobertas pelo aspeto físico, onde o nariz avantajado é motivo de frustração.»
Diz-se que vinham pessoas de longe para ver mítico nariz que ofusca todas as suas (mais importantes) qualidades. Segundo a sua biógrafa, não seria assim tão largo como o pintam. Na peça é nítido o seu complexo por esse aspeto físico, ainda que seja inteligente o suficiente para brincar com isso. É majestosamente interpretado pelo 'gigante' senhor do teatro (e da televisão e do cinema) Diogo Infante, que encabeça um enorme e talentoso elenco. É tão grande a sua interpretação, que diminui o exagerado orgão que um ser humano usa no centro da cara.

Relembro um magistral Antonio Salieri que o ator interpretou nesta mesma sala em 2011, ao lado de um não menor Ivo Canelas (na pele de Mozart) na peça Amadeus (de Peter Shaffer, numa encenação do britânico Tim Carroll, e que por sua vez inspirou o filme homónimo de Milos Forman).

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Diogo Infante (Salieri ) e Ivo Canelas (Mozart)
em Amadeus (2011)

A peça Cyrano de Bergerac foi escrita e publicada em 1897 pelo poeta francês Edmond Rostand, que se baseou na vida do homem, tornando-se a sua obra de maior sucesso. Centra-se no amor de Cyrano pela bela Roxanne (Sara Carinhas), vendo-se 'obrigado' a renunciar ao seu amor, 'oferecendo-o' a um mais belo - mas muito menos eloqueonte - amigo, Christian de Neuvillette (João Jesus).

Considerada "o último grande mito do teatro romântico francês, Cyrano de Bergerac é uma peça única da dramaturgia, escrita em forma de poema", que inspirou outras obras literárias e operáticas. Foi diversas vezes adaptada ao cinema, sendo a mais conhecida a de Jean-Claude Carrière e Jean-Paul Rappeneau, para o filme realizado por Jean-Paul Rappeneau e protagonizado pelo emblemático e inesquecível Gérard Depardieu, em 1990.


Gérard Depardieu (Cyrano)
em Cyrano de Bergerac (1990)

A versão agora em cena, com tradução de Nuno Júdice e adaptação de João Maria André, contou com a dupla de estilistas Storytailors para os criativos figurinos, que parecem feitos de papel, como que a transportar a história do livro para o texto dramático. Mas todos os aspetos sígnicos - da interpretação, texto, coreografia, caraterização (Nuno Elias), figurinos, cenografia, música (Pedro Carneiro), luz (com desenho de P. Graça) - se conjugam para a teatralidade máxima. Aliás, com momentos de teatro dentro do próprio teatro.


Cena de Cyrano de Bergerac (TNDM II)
Teatro dentro do teatro

Tudo é envolvido pela engenhosa e magnífica cenografia, a cargo de José Manuel Castanheira, cujos
«painéis-cortinas do pequeno palco no 1º acto, contêm elementos decorativos inspirados na Capela de Santa Comba, Telões / Baião. Alguns telões cenográficos  dos 1º, 2º e 3º actos contêm referências à pintura de John Constable (1776 – 1837) e de Claude Lorrain (1600 - 1682). As telas com nuvens do 4º acto reproduzem fragmentos do magnífico céu de Outono em Idanha-a-Velha e Monsanto / Idanha-a-Nova.»
Existe um certo degradé de cores, de emoções e de sentimentos nobres ao longo de toda a peça, fazendo com que evolua da viva comédia teatreira, passando pelo bucólico amor, pela nevoenta guerra, culminando na tragédia e na morte, negra e caduca. A refletir um pouco (presumo) da grandiosa vida de Cyrano de Bergerac, que morreu com apenas 36 anos, não se sabe exatamente em que circunstâncias.

Cenas de Cyrano de Bergerac (TNDM II)
Fotografias de Filipe Ferreira


EM CENA
8 JAN - 1 MAR 2015
TNDM II - SALA GARRETT
4.ª 19h
5.ª a sáb. 21h
dom. 16h
Duração : 2h25 (com intervalo)
M/12

ELENCO
Diogo Infante, Virgílio Castelo, Sara Carinhas, João Jesus, João Grosso, José Neves, Lúcia Maria, Manuel Coelho, Maria Amélia Matta, Paula Mora, Alberto Villar, Bernardo Chatillon, Celestino Silva, Frederico Coutinho, Joana Cotrim, Jorge Albuquerque, Lita Pedreira, Luis Geraldo, Marco Paiva, Nídia Roque, Rita Figueiredo, Simon Frankel e Bernardo Souto, José Sotero (ano 2013/2014 ESTC)
assistentes de encenação Fábio Vaz e Mariana Almeida (estagiários)
assistente de cenografia Luna Rebelo (estagiária)

(Mais informação na página do TNDM II)

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

A fotografia espontânea e witty de Tao Liu


Um Tao Tao na criatividade

Até recentemente Tao Liu era apenas um desconhecido que fazia leituras de água na China, com interesse por fotografia. Depois as pessoas começaram a notar as suas pertinentes fotografias capturadas pelos passeios da cidade e agora Liu tornou-se um dos fotógrafos chineses mais apetecíveis.



O fotógrafo de 32 anos captura as suas imagens em Hefei, uma cidade no leste da China. Na ultima década levantava-se às 8:30 e fazia toda a cidade na sua motorizada para fazer leituras de água pá a a Hefei Water Supply Company. Há três anos desenvolveu um interesse pela fotografia e pegou numa Fujifilm X100 para capturar momentos inesperáveis durante a sua hora de almoço e no seu caminho de volta a casa depois do trabalho.

Começou por colocar as suas imagens na Internet e no final de 2014 o mundo começou a notar no seu trabalho. Um conjunto das suas fotos tornou-se vital nas redes sociais chineses e num instante estava nas redes principais de televisão do país.


Liu diz que o seu objetivo é "relembrar as pessoas dos momentos tocantes da vida". O seu processo fotográfico envolve deambular pelas ruas da sua cidade e captar uma fotografia quando algo chama à atenção dos seus olhos; ele olha para coisas subtis em que a maior parte das pessoas não repara.

Numa entrevista à revista TIME, Liu diz que uma das suas maiores inspirações e influências é o renomeado fotógrafo japonês Daido Moriyama, cujo trabalho descobriu quando ele aprendeu mais sobre fotografia. Liu é auto-didata tendo aprendido o que pode sobre a arte através da Internet, revistas e livros de fotografia.














segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Mil maneiras de ser criativo - O candelabro de Sia


Sia é uma cantora. Sia é também uma performer. Sia é uma criativa performer que canta maravilhosamente. Embora já tivesse ouvido a sua música, Breathe, na série que segui religiosamente da primeira à ultima e inesquecível temporada da premiada série Sete palmos de terra ( Six Feet Under), não sabia que era dela. Aliás, não sabia quem era ela até que no verão de 2014 lançou o single Chandelier, cujo vídeo oficial tem, à data de hoje, mais de 466 milhões de visualizações no Youtube (quase meio bilião). Fora as vezes que passa nos canais de música e as que toca nas rádios de todo o mundo. 

De vez em quando há uma obra de arte que tem o condão de arrepiar a minha alma. Este é um desses casos. Da voz ao vídeo, à coreografia, à peculiar desenvoltura da jovem bailarina Maddie Ziegler, que consegue uma performance muito adulta e muito além das idades que, como neste caso, não incomodam minimamente a genialidade.

Em cada performance que Sia apresenta traz consigo uma interpretação diferente deste tema (e de outros). Nessas "aparições" televisivas (e não só) a cantora aparece de costas para a plateia e para as câmaras ou com a face tapada. Procura desta forma chamar à atenção para a(s) bailarina(s) que dança(m) a sua música. Consegue também com que eu esteja atento à sua potente voz, que soa tão bem ou melhor que uma gravação de estúdio. Essa é, para mim, uma distinção das pessoas que sabem, verdadeiramente, cantar. Também há outras, que eximiamente interpretam uma canção mas não lhe consegue fazer justiça. Não é o caso nem interessa desenvolver.

Na performance que recentemente fez no SNL ( Saturday Night Live ) Sia usou um visor preto na cara, fazendo sobressair a peruca loura platinada, que é a assinatura do álbum 1.000 Forms of Fear ( 1.000 Formas de Medo ). Desta vez, em vez da maravilhosa bailarina que a costuma acompanhar na maior parte delas, tinha consigo um mimo que a acompanhava interpretando a música com linguagem gestual.

Mas Sia não ficou por aqui. O último single que lançou em vídeo ( no canal de vídeo desde dia 7 de janeiro ) já está a causar polémica. E a polémica no caso dos artistas só faz bem ao seu sucesso. Em poucos dias tem mais de 61 milhões de visualizações. Chama-se Elastic Heart e é protagonizado por Maddie, a bailarina prodígio, a que se juntou Shia LaBeouf, numa relação atribulada a que muitos associam a pedofilia. Eu, sinceramente, não a vejo no vídeo, embora admita que a interpretação do mesmo possa ser essa. Os meus olhos veem corações com elasticidade para dar e vender. E cantar. E dançar, desalmadamente, como se a alma fosse a melhor coisa que temos e que dá razão à nossa vida. Provavelmente é.

Vejam, com os vossos próprios olhos, algumas das atuações que refiro. E já agora, vejam com a alma também. 
Sia - Chandelier (Live on SNL)
Publicado a 18 de janeiro, 2015
Music video by Sia performing Chandelier (Live on SNL). (C) 
2015 Monkey Puzzle Records, under exclusive license to RCA Records
(se não conseguir visualizar o filme clique aqui)

Sia - Chandelier, with Maddie Ziegler & Allsion Holker on Dancing With The Stars
Publicado a 23 de setembro, 2014
Visualizações: 10.112.982
(se não conseguir visualizar o filme clique aqui)

Sia - Chandelier (Official Video)
Publicado a 6de maio, 2014
The official director's cut for the 4 time Grammy nominated hit "Chandelier" directed by Sia and Daniel Askill, featuring Maddie Ziegler.
Visualizações: 466.010.530
(se não conseguir visualizar o filme clique aqui)

Sia - Elastic Heart feat. Shia LaBeouf & Maddie Ziegler (Official Video)
Publicado a 7 de janeiro, 2015
The official video for "Elastic Heart" directed by Sia and Daniel Askill, featuring Shia LaBeouf and Maddie Ziegler. choreographed by Ryan Heffington.
Visualizações: 61.091.952
(se não conseguir visualizar o filme clique aqui)

Sia - Elastic Heart (Live on SNL)
Publicado a 18 de janeiro, 2015
Music video by Sia performing Elastic Heart (Live on SNL). (C) 2015 Monkey Puzzle Records, under exclusive license to RCA Records
(se não conseguir visualizar o filme clique aqui)

Sia Performs Elastic Heart
Publicado a 4 de julho, 2014
Jimmy Kimmel Live
(se não conseguir visualizar o filme clique aqui).  


Capa do disco em que se vê a peruca, destacando-se do fundo negro, e que é a imagem de marca das performances da cantora-artista




domingo, 18 de janeiro de 2015

Fotografias de vibrantes paisagens chinesas


"No nordeste da província chinesa Gansu fica o Zhangye Danxia Landform Geological Park, uma magnífica expansão de terra conhecida pelas suas formações de pedra colorida. Como arco íris rochosos de cores em banda desde vibrantes vermelhos aos cremosos laranjas, verdes, amarelos, ao longo de toda a montanha, formando o mais bonito "bolo de camadas" geológico que alguma vez se viu. 


Com várias centenas de metros de altura, as rochas multicoloridas são resultado de areia com outros minerais que ocorreram durante 24 milhões de anos devido aos movimentos das placas tectónicas. Durante o milénio o vento e a chuva encarregaram-se de esculpir as rochas com as diversas formações tecnicolores que vemos hoje.


Embora algumas destas fotos possam ter tido algum tratamento para tornar as cores ainda mais vivas, não se pode negar a grandeza destas formações. Declarado Património Mundial pela UNESCO em 2010 e um Geoparque Nacional em 2011, a formação de terra tornou-se uma atração turística perto de Zhangye. Foram feitos acessos e passeios para que os visitantes possam explorar o terreno e deleitar os olhos nesta vista verdadeiramente magnífica."

Quem disse que a Terra é apenas uma massa uniforme de azul?







Créditos Fotográficos: ImagineChina
via [aestheticgoddess], [Huffington Post] [mymodernmet]

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Homens e Deuses II : Rei Édipo, de Sófocles


O clássico que cega, mas não cede

Enquanto a epopeia contava os episódios, a tragédia vem mostrá-los. Os autores das tragédias foram buscar o assunto das suas obras à epopeia. Partilha dela a arte de construir personagens e cenas capazes de comover, apresentam o sentimento da vida, inspiram o terror e piedade. Dessa forma visualizamos as cenas e acreditamos no enredo.

Até Ésquilo (525-456 a. C.) só existia um narrador. Ele introduziu duas personagens na acção. Sófocles (496-405 a. C.) terá introduzido três actores e a cenografia, segundo Aristóteles (Poética, 1449 a). Em Eurípedes (480 – 406 a. C.) estas multiplicam-se, numa fórmula e personagens deliberadamente “patéticas” (Romilly). O desenlace das peças é previsível e os autores demoram o tempo de inúmeros versos a descrever apenas sentimentos ou a narrar acontecimentos sem interesse. Ésquilo joga com a previsão e com o efeito de uma certeza crescente. Os sucessores de Ésquilo estimularam a incerteza e o efeito surpresa, para alimentar o interesse nas peças. Eurípides chamará intriga às reviravoltas e peripécias, a que acrescenta surpresas, confusões e reconhecimentos.


Tal como na epopeia, nas tragédias os deuses nunca estão ausentes. Os de Sófocles, embora não tão pesados emocionalmente como os de Ésquilo, nem imediatamente sensíveis, são revelados “à parte”, escapando à imperfeição e ao tempo, «não envelhecem» (coro, no Rei Édipo). Os homens vivem o efémero, são incertos, instáveis e frágeis. Os deuses representam a luz, a perenidade, a serenidade.
O sentimento de Édipo, por exemplo, é de uma intransigência demasiadamente humana. Embora culpado, não se deixa vergar, é obstinado por aquilo que quer, é violento, irritável e acusa sem ponderar as palavras: «[...] apanhei-o a mover uma conspiração contra a minha pessoa [...]» (a Creonte, v. 642).
O jogo entre homens e deuses, marcado por oráculos que semeiam o erro, é a ideia mestra de Rei Édipo e o homem é o joguete da ironia da “sorte” previsível. Muitas vezes  precipita-se para a sua queda pelo próprio esforço que faz para lhe escapar. «Irei, então, falar, já que me insultaste pela minha cegueira. Tu vês e não tens olhos para a miséria a que chegaste.» (Tirésias a Édipo, v.413).

Mas esse destino não é questionado, ninguém se interroga sobre a razão daquilo que sucede a Édipo: não há explicação mas também não há problema – as coisas são, simplesmente, assim. Sófocles contenta-se em mostrar a impotência do homem, que nada pode fazer para alterar o seu destino.
A epopeia e a tragédia abordam o mesmo assunto e os mesmos mitos. Não é de espantar: a epopeia fora, durante séculos, o género literário por excelência. Embora existam tragédias históricas, estas são tratadas à maneira de um mito: serve de exemplo, apenas mantemos dela o sentido humano, modificando-a a seu gosto. Já se considerava que os mitos gregos na sua origem narravam uma história longínqua e heróica mas verídica. Na Grécia o “renascimento” do homem é o “milagre” que nos transmite o conhecimento que temos do mundo. A humanidade é o centro do mundo. Com essa nova visão e evolução os gregos começam a “criar” os deuses à sua imagem, conferindo-lhes uma humanização com que nos identificamos e familiarizamos.

Édipo explica o enigma da Esfinge, Jean Auguste Dominique Ingres, c. 1805
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CALVINO, Italo – Porquê ler os clássicos (Teorema, 1993);
HAMILTON, Edith – A Mitologia (Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1983);
PEREIRA, Maria helena da Rocha – Estudos de História da Cultura Clássica, I Volume (Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2006);
ROMILLY, Jacqueline de - Homero, Introdução aos poemas Homéricos ( Lisboa, Edições 70, 2001); A Tragédia Grega  (Edições 70, 1997);
SÓFOCLES – Rei Édipo – Introdução, tradução do grego e notas de Maria do Céu Zambujo Fialho (Edições 70, 2008);

sábado, 10 de janeiro de 2015

Perceção estética, ciência e a arte cinética de Theo Jansen


Sobre o conceito de obra de arte
tomada como uma ciência

(Bourdieu:334) 


Entendendo que as ciências são disciplinas exactas, quase não teríamos aqui muito para discussão, não fosse o assunto bem mais complexo que  A + B = C. Graças às eternas dissertações que envolvem os gostos dos “outros”, acerca do que é belo ou feio, ou sobre o que é ou não arte, o assunto não é assim tão linear.

Partindo do manifesto referido por Theodor Adorno, que
«tudo o que diz respeito à arte deixou de ser evidente» - (Adorno:11)
é pertinente, então, referir que esse problema emerge da difícil e enorme tarefa com que nos debatemos, quase a cada segundo, que é o de tornar comum a nossa mensagem para com os outros. Por muito que os entendidos na matéria queiram classificar (com esquemas mais ou menos complexos), através de palavras, as obras de arte, o mal-entendido é quase certo. Que é como quem diz: é difícil acertar na sua adjectivação (ou de qualquer objecto ou coisa à nossa volta).

O contexto histórico, espacial ou social, toma, nesta análise da comunicação através da arte, um papel fundamental e não há, aparentemente, fuga possível às definições, noções ou categorias a que os artistas estão sujeitos, quer por parte de outros artistas, dos críticos ou do público em geral. Neste jogo de lutas (Bourdieu:336), tantas vezes “injusto”, no qual o artista se vê entre os mais variados interesses e a “parede”, ele tem de fazer “sobreviver” a sua obra emergindo, através dela, o que é verdadeiro.



Como a «arte implica a existência do seu sucesso, ou então não o será» (Adorno:213), o artista tem de ser o “ser superior” e elevar o resultado do seu trabalho acima de tudo, de todos os outros e de si próprio. É com o objectivo de alcançar essa “arte superior” que o seu “criador” tenta aliar, num só corpo, «com a arte da sinceridade estética» (Vila Maior:51) e com mestria, a reflexão e a diversão.

Mas o problema é que não é objectiva a forma como se traz à “tona” essa referida essencialidade. Se por um lado dessa comunicação temos um emissor preocupado (?) com o resultado da sua mensagem, por outro temos um receptor que, dependendo do seu “habitat” ou do seu “habitus”, terá uma percepção diferente daquela pretendida pelo primeiro (o emissor). E essa é uma questão a que o artista não pode (nem deve?) dar resposta.

Ao ver-se no meio de um circuito consumista, no qual são protagonistas, não só o “consumidor” final da obra de arte, mas também todos os intervenientes no campo artístico, o artista não pode deixar-se enclausurar ou intimidar.

A “fuga” do autor a estes condicionalismos pré-estabelecidos, será feita através do olhar para si próprio. O que ele sente perante o que o rodeia irá resultar numa forma pura que se eleva acima de qualquer crítica. A percepção individual e “trans-histórica” sobreviverá ao seu autor porque é pura, como o foi o sentimento que a originou. Desta forma se fecha um círculo perfeito da obra de arte, que nasce nos confins do talento humano e cresce, infinitamente, através dos sentidos de quem a percepciona. Sem formalismos ou observações críticas que aprisionem o seu “real” sentido estético.


As "criaturas malucas" criadas pelo holandês Theo Jansen (n. 1948), são um perfeito exemplo de escultura cinética, que alia a ciência da engenharia à arte, com criaturas feitas de tubos de plástico, que conseguem mover-se sozinhas ("Animaris umerus"). Adquirem, assim, com o seu engenho e criatividade, vida própria, com uma inteligência que é artificial.

 "The walls between art and engineering exist only in our minds." - Theo Jansen
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  ADORNO, Theodor (S/d) - Teoria Estética, Lisboa, Edições 70;
  BOURDIEU, Pierre (1996) - As Regras da Arte, Lisboa, Editorial Presença;
  VILA MAIOR, Dionísio (2001) – Literatura em “Discurso(s)”, Coimbra, Pé de Página Editores


quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Retratos dinâmicos de dança e de pó congelados no tempo, por JeffreyVanhoutte



No Brasil o dia 8 de janeiro é o dia do fotógrafo (o dia mundial da fotografia celebra-se a 19 de agosto). Para o comemorar, partilho uma série de fotos em que o fotógrafo belga Jeffrey Vanhoutte consegue captar, com a sua máquina, instantes em que uma bailarina salta ao mesmo tempo que solta pó no ar. O resultado são nuvens dinâmicas que Vanhoutte 'congelou' para a campanha da agência criativa Norvell Jefferson, para publicitar o leite em pó da Frieland Campina Kievit.


O pó que a bailarina atira para o ar cria formas incríveis ao seu redor. No meio de algumas nuvens, em que se conseguem ver as partículas do pó, ela parece levitar, sem peso, como uma pluma. Suspensa, com os movimentos congelados mas graciosos e elegantes, como se fosse um anjo a pairar ou um pássaro a levantar voo.

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