sábado, 10 de janeiro de 2015

Perceção estética, ciência e a arte cinética de Theo Jansen


Sobre o conceito de obra de arte
tomada como uma ciência

(Bourdieu:334) 


Entendendo que as ciências são disciplinas exactas, quase não teríamos aqui muito para discussão, não fosse o assunto bem mais complexo que  A + B = C. Graças às eternas dissertações que envolvem os gostos dos “outros”, acerca do que é belo ou feio, ou sobre o que é ou não arte, o assunto não é assim tão linear.

Partindo do manifesto referido por Theodor Adorno, que
«tudo o que diz respeito à arte deixou de ser evidente» - (Adorno:11)
é pertinente, então, referir que esse problema emerge da difícil e enorme tarefa com que nos debatemos, quase a cada segundo, que é o de tornar comum a nossa mensagem para com os outros. Por muito que os entendidos na matéria queiram classificar (com esquemas mais ou menos complexos), através de palavras, as obras de arte, o mal-entendido é quase certo. Que é como quem diz: é difícil acertar na sua adjectivação (ou de qualquer objecto ou coisa à nossa volta).

O contexto histórico, espacial ou social, toma, nesta análise da comunicação através da arte, um papel fundamental e não há, aparentemente, fuga possível às definições, noções ou categorias a que os artistas estão sujeitos, quer por parte de outros artistas, dos críticos ou do público em geral. Neste jogo de lutas (Bourdieu:336), tantas vezes “injusto”, no qual o artista se vê entre os mais variados interesses e a “parede”, ele tem de fazer “sobreviver” a sua obra emergindo, através dela, o que é verdadeiro.



Como a «arte implica a existência do seu sucesso, ou então não o será» (Adorno:213), o artista tem de ser o “ser superior” e elevar o resultado do seu trabalho acima de tudo, de todos os outros e de si próprio. É com o objectivo de alcançar essa “arte superior” que o seu “criador” tenta aliar, num só corpo, «com a arte da sinceridade estética» (Vila Maior:51) e com mestria, a reflexão e a diversão.

Mas o problema é que não é objectiva a forma como se traz à “tona” essa referida essencialidade. Se por um lado dessa comunicação temos um emissor preocupado (?) com o resultado da sua mensagem, por outro temos um receptor que, dependendo do seu “habitat” ou do seu “habitus”, terá uma percepção diferente daquela pretendida pelo primeiro (o emissor). E essa é uma questão a que o artista não pode (nem deve?) dar resposta.

Ao ver-se no meio de um circuito consumista, no qual são protagonistas, não só o “consumidor” final da obra de arte, mas também todos os intervenientes no campo artístico, o artista não pode deixar-se enclausurar ou intimidar.

A “fuga” do autor a estes condicionalismos pré-estabelecidos, será feita através do olhar para si próprio. O que ele sente perante o que o rodeia irá resultar numa forma pura que se eleva acima de qualquer crítica. A percepção individual e “trans-histórica” sobreviverá ao seu autor porque é pura, como o foi o sentimento que a originou. Desta forma se fecha um círculo perfeito da obra de arte, que nasce nos confins do talento humano e cresce, infinitamente, através dos sentidos de quem a percepciona. Sem formalismos ou observações críticas que aprisionem o seu “real” sentido estético.


As "criaturas malucas" criadas pelo holandês Theo Jansen (n. 1948), são um perfeito exemplo de escultura cinética, que alia a ciência da engenharia à arte, com criaturas feitas de tubos de plástico, que conseguem mover-se sozinhas ("Animaris umerus"). Adquirem, assim, com o seu engenho e criatividade, vida própria, com uma inteligência que é artificial.

 "The walls between art and engineering exist only in our minds." - Theo Jansen
(carregue na fotografia para ver em tamanho maior 
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(se não conseguir visualizar o vídeo acima, carregue aqui)
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  ADORNO, Theodor (S/d) - Teoria Estética, Lisboa, Edições 70;
  BOURDIEU, Pierre (1996) - As Regras da Arte, Lisboa, Editorial Presença;
  VILA MAIOR, Dionísio (2001) – Literatura em “Discurso(s)”, Coimbra, Pé de Página Editores


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